segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

vida?


alcançar o Sentido
seria deter uma visão visceral de tudo?
células respirando
sangue hemolinfa seiva fluindo?
coração pulsando?
uma visão microscópica
e transcendente de tudo?
usufruir o todo de um suposto nada...
materializar o imaterial?
penetrar o âmago de gaia...
vislumbrar pandora, a máquina do mundo?

não vejo nada, entretanto.
não sinto nada
tudo está mais parado do que nunca
não sinto partículas elementares
e primordiais drenando a paisagem
as pessoas ou eu mesmo.
tudo é casual e assimétrico e acidental
tudo está destruído e não parece real
...desfigurado, frankenstein moral.


esta noite tem cheiro de noite
e nesta noite com cheiro de noite
o tempo anda em câmera lenta
e é possível sentir cada movimento
é possível sentir a vida em sua essência
cada ar que entra e sai do nariz e da boca
cada saliva que é engolida.
tudo desmoronou atrás
resta ainda a poeira da ruína
sobrepondo-se no ar
mas isso não oprime mais,
você continua respirando
conscientemente
continua sentindo a vida
de maneira natural
sente até certo prazer nisso
no simples ato de existir
de respirar e expirar
de engolir saliva
de beber água devagar
de sentir o cheiro puro da noite.
cada letra cada palavra cada ideia banal
escrita sem pensar soa legal
a leitura de um período curto
é algo insólito
as mãos se tateando calmamente
sentir a sua própria matéria
se torna um deleite sólido.
a mentalização de uma fonte
fluindo água fria
com sua peculiar sonoplastia
pendula.
nada está bem
mas tá tudo bem
você está parado
respirando
tá tudo bem
pode acreditar.

domingo, 11 de dezembro de 2016



as palavras e as ideias ficam plásticas
mais significativas que seus significados
enxergo seus sinestésicos relevos
seus mares de morros sem fim
sua fauna e sua flora complexas
niilistas e esvoaçantes
suas mentiras travestidas em verdades
sua essência basal e banal
suas formas ambíguas, fronteiras imprecisas.

uma cinética esfera muscular
que oscila senoidal sobre si e se expande
radial, aumentando seu raio
crescendo suas ondas de loucura
e excessiva rutilância
para além da consciência humana
para além de uma dimensão perceptível.

eu poderia
com as pontas dos meus finos dedos
sentir todas as células de seu epitélio
indescritível com palavras deste universo.

sexta-feira, 18 de novembro de 2016



eu ainda me despedaço
ainda me mutilo
por tudo aquilo
que deveria fazer e não faço.



retrato


tu és mais uma em um planeta de bilhões
onde somos todos banais
onde somos todos iguais
mas insisto no momento
confesso, não me aguento
imputo a ti idiossincrasias
faço assim dos meus dias
algo que pode ser arrastado
insisto na artificial obsessão
por um espírito palpável, pseudo-amado
que crio e vislumbro em ilusão.

deposito meu todo no teu sorriso
num anteparo interior reflexivo
observo teu corpo comum, liso
e suave, mantenho-me vivo
fazendo de ti meu piso
onde planto a semente
que consome meu tédio
e ilumina com raio nédio
a sombra de um deficiente.

mas sobre teu piso eu pisei
pisei sobre aquilo que criei
(um monstro criado pra subsistência
não poderia ir além da latência)
teus encantos fictícios
frutos de meu obsessivo ofício
estão, srta gray, num retrato
que lentamente mato
cirurgicamente, com certa dor
corto teu quadro cinza, sem cor.

domingo, 6 de novembro de 2016



cabelos, cílios e olhos negros
lábios vermelhos
tu acendes um cigarro
e no intervalo de tempo
que tragas a fumaça
com os olhos cerrados
não há mais tempo
o átimo é eterno
até o momento
que abres as pálpebras
e me diriges um olhar
de sensualidade inexorável.

sábado, 5 de novembro de 2016



às vezes eu esqueço o seu rosto
mas sua silhueta vibra em minha mente
e suas moléculas astrais
e suas células pseudo-reais
ainda detém poder suficiente
para me arrancarem
um ingênuo sorriso.